3 de janeiro de 2010

Uma efêmera sensação de descoberta

No 80° ano do Século XXI, nas salas de alta restrição do Laboratório Quântico do Atacama (um grande núcleo de pesquisa físico-computacional conveniado pelos países europeus e sul-americanos, situado no deserto chileno), foi feita uma das grandes descobertas até então.

Adalberto Aimar, um argentino PhD em computação quântica aliada à neurociência, ainda estava deslumbrado com a sua mais recente conquista, levando mais dois dias de cálculos e anotações diante de seu supercomputador pessoal recém-construído sob a ajuda reduzida de robôs-operários para concluir que havia mesmo alcançado o seu intento. Aimar era um dos poucos cientistas que tinham um verdadeiro centro de estudos à sua disposição, um galpão que poderia ser comparado a cinco hangares lado a lado, equipados com computadores quânticos sequenciados e construídos como um grande simulador cerebral por robôs programados para atender unicamente ao que sua pesquisa demandava.

Depois que ele percebeu que todos os seus cálculos estavam corretos, enfim levou-os para supervisão e análise do Chefe de Instalação Presidencial do referido laboratório, Lewis M. Queen, um inglês que estava quatro cargos abaixo do Presidente, mas era o único com quem os cientistas tinham direito a conversar, dadas as condições de total segurança e hierarquia.

- Mr. Queen - disse Aimar -, meus cálculos apontam que a minha pesquisa parece ter chegado ao ponto definitivo.

- Vamos vê-los, então - respondeu-lhe Queen.

Aimar deu dois cliques em seu pequeno computador portátil e imprimiu uma pequena folha de 20x20cm contendo o resumo de sua pesquisa, toda registrada na língua ilamidita, um idioma secreto e restrito aos membros do Laboratório.

Enquanto Queen passa os olhos na pequena folha, Aimar prosseguia:

- Eu observei, Mr. Queen, que ao acionar esses cálculos o conjunto dos computadores de meu centro de estudos quintuplica a quantidade de informações oferecidas por nanossegundo, superando em dez mil vezes as transmissões que ocorrem no cérebro humano. Eu consegui fazer com que eles recebessem impulsos químicos de pequenos transmissores moleculares e convertessem-nos em sinais elétricos, podendo se deslocar a longuíssimas distâncias para chegar às áreas de publicação, disparando os mecanismo de comunicação óptica, liberando transmissores para, ao mesmo tempo, uma quantidade quase ilimitada de células mecânicas pré-construídas.

- Isso é o que estou pensando, Aimar? - perguntou Queen, visivelmente espantado.

- Sim, senhor - disse Aimar, com semblante de vitorioso: eu criei o primeiro cérebro artificial polivalente.





Daquele instante em diante, não fazia mais sentido a pesquisa dos outros cientistas. A verdadeira razão de existir daquele Laboratório já havia sido alcançada pelo gênio argentino. Ouvia-se nos dias subsequentes burburinhos nos corredores de que todos os investimentos daquele centro seriam cortados, mas a verdadeira causa ninguém sabia. No final das contas, não era de conhecimento de ninguém aquela conquista, à exceção de seu inventor e das mais eminentes autoridades dos países envolvidos.

Isso, no entanto, foi de encontro aos interesses dos principais mentores europeus daquele núcleo: a Inglaterra, a França e a Alemanha. Eles estavam muito contrariados com o avanço rápido dos países latinos, sobretudo Brasil, Venezuela e Argentina. Estes países já haviam, dentro de seus territórios, elaborado avançadas pesquisas nucleares, medicinais, astronômicas e, agora, tomavam as rédeas da computação quântica. O desconforto foi geral.

Aimar voltara a seu centro e continuava estudando, mas estava extasiado com a conquista. Logo recebeu uma visita que o deixaria bastante perplexo (nenhum cientista recebia visitas).

- Quem é você? - perguntou Aimar em ilamidita.

- Venha comigo, você corre perigo - disse o sujeito vestido de terno. Ele falava espanhol.

- Por que está falando essa língua?

- Porque é mais seguro. Agora venha - o sujeito mostrou a sua identificação, chamava-se Leonardo Polvo, da Alameda Luz, uma corporação transnacional que controlava o governo argentino (naquela época, corporações comerciais dominavam a maioria dos governos).

Quando o acompanhava, no entanto, Aimar permanecia receoso. Tão receoso que acionou o alarme do Laboratório com um simples olhar ao relógio de parede (ele capta pedidos de ajuda pelo globo ocular a 10 metros de distância). Foi o suficiente para que unidades paramilitares se dirigissem ao prédio, cercando-no em menos de 5 minutos num exercício de absoluta eficácia. Quando Aimar e Polvo se dirigiam pelo corredor solar - que não tem paredes para fora, apenas uma vidraça - foram alvejados por atiradores situados do lado de fora do laboratório. Polvo morreu na hora. Aimar, embora não fosse alvo, foi atingido e foi internado imediatamente. Passou três semanas em coma induzido.





Quando recebeu alta do hospital, três meses depois do acontecido, foi recomendado a Aimar ficar em casa (ele não tinha casa, morava no Laboratório, mas foi providenciada para ele um apartamento na periferia de Buenos Aires), e também lhe foi informado que ele estava com uma aposentadoria. O período de tempo que ele passara fora do Laboratório excedia o permitido, e o fato de ele estar em coma não serviu de argumentação. Com isso, Aimar não pôde dar continuidade às suas pesquisas e sequer voltar ao Laboratório para pegar suas coisas.

Aimar não podia recuperar o seu cargo nem o seu projeto, pois ambos eram absolutamente secretos, não havendo registro algum deles nos órgãos convencionais. A Justiça o questionaria por não possuir quaisquer documentos. A imprensa o desdenharia por considerá-lo um lunático em busca de fama rápida. Aimar foi aposentado como professor da Universidade de Tecnologia Avançada de Ushuaia, onde ele nunca pisara antes.

Um mês depois, a Argentina cortou todas as relações diplomáticas e de cooperação acadêmica e científica com Inglaterra, França e Alemanha, alegando divergências comerciais em virtude da preferência dos europeus por carne bovina uruguaia.



4 comentários:

Unknown disse...

Feliz ano novo!
Nossa! Super interessante esse post
passa no meu blog
this-is-my-life-vanna.blogspot.com

Felipe Dib Boufflers disse...

fiquei extasiado com o texto...

Jad disse...

Mas uma vez adorei o texto!!!

Leon, você já leu O Guia Do Mochileiro Das Galáxias?? Depois desse texto, acho que você gostaria desse livro!

Beijos.

Rafael Rosa disse...

....escrevendo sempre muito bem!
Ah! Da uma lida nO Guida do Mochileiro....acho que vai gostar mesmo!

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